terça-feira, 17 de maio de 2011

Quem não sou eu?

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Nos deixa angustiados

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Certamente você já deve ter presenciado alguém falando literalmente essas palavras, ou tendo uma atitude inspirada nela:

“Você sabe com quem está falando?”


Pergunta curiosa, quem é essa pessoa? Como definir alguém com uma meia dúzia de palavras? Tenho uma certa piedade de quem faz essa pergunta, pois se ela está perguntando é porque não deve ter certeza de quem é.

Quando nascemos os nossos pais nos ajudam a construir um senso de identidade que delimita nossos desejos, impulsos e ações. Eles emprestam sua personalidade (ou identidade) para que moldemos nossas feições emocionais.

Crescemos um pouco mais e ampliamos o círculo de convívio. Passamos a questionar aquele modelo absoluto sobre a verdade de nós mesmos. Debatemos e gastamos horas de brigas com os pais com a intenção não-consciente de criar uma casca que vá além da infância. Brigamos para nos diferenciar. Quanto maior a briga maior o nível de dependência e de dor no processo de desligamento progressivo.

Depois começamos a cristalizar uma imagem mais ou menos estável de nossa identidade. Os papéis que assumimos nos descrevem: amigo, filho, estudante, profissional, namorado, estudioso, bagunceiro, estagiário, CEO. Passamos anos e anos brincando de saber quem realmente somos. Matamos e morremos por essa certeza tola.

A maturidade vem e com ela os papéis se enfraquecem. A maternidade já cumpriu seu papel, o casamento já foi exaurido em suas possibilidades, a aposentadoria se anuncia. Sem papéis definidos como definir o que somos?

Surge a pergunta que outrora foi feita na adolescência: quem sou eu?

Mas o grande conflito não é responder quem sou eu, mas quem eu preciso deixar de acreditar eu sou.

Sou pai ou assumi por anos uma atribuição para os filhos?

Sou CEO ou gerenciei uma empresa?

Sou marido ou compartilhei experiências significativas com uma mulher?

Identidades sendo lançadas na fogueira. Ficamos no limbo sem saber se nos resta o céu ou o inferno. Bom ou mau, certo ou errado, justo ou injusto são categorias que já não definem a complexidade da natureza humana. Reduzem uma riqueza num pequeno cofre apertado.

Esse limbo consome muitos neurônios e nos deixa angustiados.

Já não nos vemos servindo ativamente a sociedade que cobra produção financeira. Que tipo de papel tem essa pessoa na maturidade?

Entendo que ela tem o desafio de produzir uma sustentação invisível ao redor de si mesma.

Essa identidade diluída e sem fronteiras definidas oferece a oportunidade de usufruir de uma liberdade que sempre foi presente, mas ignorada: não sou nada e posso caminhar por tudo.

Quem dera todos tivessem a oportunidade de dançar entre o jogo relativo dos papéis cotidianos sem se perder neles. Diminuir aquele senso de autoimportância que nos damos e que causam a maioria das confusões diárias.

As ofensas seriam brisas em nossos ouvidos e ataques seriam apenas movimentos de contraposição à idéia que fazemos de nós.

Mergulhar no rio da personalidade sem se aprisionar ou pertencer a ele.

Volto a perguntar agora, quem não sou eu?

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